sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Material publicado sobre o caso das diárias de vereadores da Câmara Municipal de Cornélio Procópio no blog do Instituto Ame Cidade

Instituto Ame Cidade denuncia ao Ministério Público suspeita de irregularidades no pagamento de diárias para vereadores de Cornélio Procópio

INSTITUTO AME CIDADE, 17 de novembro de 2009

O Instituto Ame Cidade descobriu indícios de graves irregularidades na prestação de contas de despesas com diárias da Câmara Municipal de Cornélio Procópio, Paraná. As diárias são destinadas ao pagamento de hospedagem e alimentação de servidores e vereadores em missão oficial do Legislativo, participação em cursos e treinamentos.

A suspeita de irregularidades envolve o nome de três vereadores e surgiu a partir da análise de documentos recebidos pelo Instituto Ame Cidade depois da solicitação de informações junto à Câmara. Os dados levantados fazem crer que foram concedidas e pagas diárias em datas em que os vereadores estavam no município.

A pesquisa cobre apenas o período de janeiro a agosto de 2009, tomando por base os relatórios contábeis com as despesas de diárias e cópias das solicitações de viagem e dos relatórios de viagens de cada um dos beneficiados com diárias no período citado.

Comparando esses dados com outros documentos oficiais, foi possível descobrir que os vereadores Edimar Gomes Filho (PPS), Sebastião Angelino Ramos (PTB) e Vanildo Felipe Sotero (PR) receberam diárias para viagens a Curitiba em datas em que constam como presentes em reuniões daquela Casa.

O Instituto Ame Cidade está entrando hoje no Ministério Público com um pedido de investigação. Caso sejam comprovadas irregularidades a conseqüência deve ser uma Ação Civil Pública de Improbidade Administrativa contra os implicados.

Na representação, o Instituto Ame Cidade também pede ao Ministério Público que a denúncia seja encaminhada ao Tribunal de Contas do Paraná.

Além dos vereadores citados, o pedido de investigação atinge também o presidente da Câmara, Helvécio Alves Badaró, responsável pela autorização do pagamento das diárias. No período ao qual o Instituto Ame Cidade teve acesso, Badaró recebeu no total R$ 7.572,94 em diárias.

Caso sejam comprovadas irregularidades nos gastos, entre outras penalidades os quatro vereadores podem até perder os mandatos por falta de decoro.

Na representação ao MP o Instituto Ame Cidade apresenta documentação da própria Câmara Municipal que confirma a presença dos vereadores em sessões legislativas na mesma data em que eles deveriam estar em Curitiba, conforme está descrito no pedido de diárias. A distância entre Cornélio Procópio e a capital é de 398 quilômetros. As sessões ordinárias da Câmara acontecem nas terças-feiras, com início às 20 horas.

Na confrontação entre os documentos de solicitação de diárias e as atas de sessões da Câmara existem até datas em que o vereador recebeu dinheiro de hospedagem e alimentação destinado à estadia em Curitiba quando, segundo a ata, no mesmo dia estava presente à sessão legislativa em Cornélio Procópio onde secretariava a reunião.

O vereador Edimar Gomes Filho (PPS) recebeu três diárias para viagem à Curitiba no período de 15 a 17 de fevereiro deste ano, saindo às 10 horas da manhã de Cornélio Procópio e voltando da capital às 18 horas. De acordo com as atas oficiais da Câmara, o vereador secretariou duas reuniões no dia 17, uma delas extraordinária. Neste caso, ainda que o vereador tivesse garantido sua presença com um esforço extraordinário, ele acabou recebendo todas as diárias. O total foi de 500,00 reais.

Outro episódio em que o vereador é citado em ata secretariando a sessão legislativa no mesmo dia em que garante em outro documento ter viajado para Curitiba acontece entre os dias 25 e 27 de agosto. Na solicitação de viagem a saída está marcada para as 14 horas do dia 25. Na mesma data seu nome aparece em ata secretariando a reunião ordinária e também a extraordinária. Ele recebeu 600 reais de diárias de viagem.

Edimar Gomes Filho recebeu entre janeiro e agosto deste ano um total de R$ 6.880,00 em diárias.

Outro vereador cujo nome aparece secretariando sessões na mesma data em que declarou estar presente em Curitiba é Vanildo Felipe Sotero (PR). Sua solicitação de viagem é de 25 a 27 de março, saindo às 8 horas e retornando às 18 horas. Ele solicitou três diárias, um total de 600 reais, que foi pago.

No entanto, em 26 de março foi realizada sessão extraordinária e o vereador estava presente. No dia 27 de março houve mais uma sessão extraordinária e novamente o vereador estava presente e até secretariou a reunião.

E esta não é a única situação com este tipo de contradição envolvendo o vereador. Em outra solicitação de viagem, saindo às 14 horas do dia 3 de agosto e voltando no dia 5 do mesmo mês às 15 horas, também surge a mesma estranha coincidência.

No dia 4 de agosto teve sessão extraordinária na Câmara e o vereador consta como estando presente e secretariando a reunião. No dia 5 teve mais uma sessão extraordinária e lá está de novo registrado em ata a presença de Vanildo Felipe Sotero e também secretariando.

Ele recebeu 800 reais, quantia relativa a três diárias de viagem para Curitiba. No total, entre janeiro e agosto, Vanildo Sotero recebeu de diárias R$ 3.500,00.

Já o vereador Sebastião Angelino Ramos assinou solicitação de viagem à Curitiba com saída às 9 horas do dia 12 de agosto e retorno no dia 14 do mesmo mês às 11h. Pediu duas diárias no total de 600 reais e recebeu.

No dia 13 teve sessão extraordinária em Cornélio Procópio, com a ausência do vereador registrada em ata. Já no dia 14, ele tem a presença registrada em ata em outra sessão extraordinária. Acontece que esta sessão ocorreu às 9 horas e sua previsão de retorno é para 11 horas. Neste caso, ele até confirmou a data do retorno em solicitação de reembolso extra de 55 reais para transporte e locomoção.

Este vereador tem também outra solicitação de viagem que entra em contradição com as atas da Câmara. A saída para Curitiba é prevista para as 14 horas do dia 25 de agosto e o retorno para o dia 27 às 18 horas. Ele recebeu 600 reais relativos a duas diárias.

Ocorre que no dia 25 de agosto teve sessão ordinária e sessão extraordinária. E o vereador é citado em ata como estando presente às duas reuniões.

O petebista Sebastião Angelino Ramos foi o vereador que mais recebeu diárias no período analisado. Seu total foi de R$ 9.545,00.

Além dessas irregularidades apontadas pelo Instituto Ame Cidade, é possível constatar que a Câmara Municipal vem concedendo um número bem alto de diárias. Apenas no período citado o gasto total, englobando o ressarcimento de despesas, foi de R$ 65.704,24. Existem também denúncias de que este procedimento estaria sendo usado de forma indevida, o que exigiria outras investigações.


Os documentos citados estão publicados em fac-símile em nossa página no site Flickr, como pode ser visto nos links dispostos ao longo do texto. Para ver todas as pastas, siga para a página clicando aqui.


Vocabulário político

ONIPRESENTE: O dicionário ensina que "onipresente" é o que "está presente em todas as partes" e remete para o fenômeno da ubiquidade: que está ao mesmo tempo em toda a parte. As raízes cristãs do brasileiro facilitam bastante a compreensão da palavra, pois Deus é onipresente.

Esta capacidade, portanto, não é humana. Ninguém pode estar em dois lugares ao mesmo tempo. Nem se for vereador.


Diárias de vereadores causam revolta. Pedidos de viagem eram para reuniões na Assembleia com o deputado Romanelli

INSTITUTO AME CIDADE, 19 de novembro de 2009

A suspeita de irregularidades levantada pelo Instituto Ame Cidade em prestações de contas de diárias de viagem para vereadores da Câmara Municipal de Cornélio Procópio, Paraná, causou muita indignação não só entre os procopenses, mas também em toda a região.

Estudando documentos obtidos junto à Câmara por meio de pedido oficial de informações, o Instituto Ame Cidade descobriu que os vereadores Edimar Gomes Filho (PPS), Sebastião Angelino Ramos (PTB) e Vanildo Felipe Sotero (PR) receberam diárias para viagens a Curitiba em datas em que constam como presentes em reuniões daquela Casa.

De posse desses documentos, foi dada a entrada junto ao Ministério Público de um pedido de investigação. O Instituto Ame Cidade solicitou também ao MP que a denúncia seja encaminhada ao Tribunal de Contas do Paraná.

O pedido de investigação atinge também o presidente da Câmara, Helvécio Alves Badaró (PTB), responsável pela autorização do pagamento das diárias. Se forem comprovadas irregularidades nos gastos os quatro vereadores podem até perder os mandatos por falta de decoro.

A notícia sobre o escândalo foi transmitida em rádios e televisões de Londrina e repercutiu na internet, sendo publicada em sites e blogs dos mais variados.

Houve muito espanto com o montante gasto em diárias (de janeiro a agosto foi de R$ 65.704,24) e também com as altas quantias gastas por alguns vereadores. Somando-se as diárias do período recebidas pelos vereadores citados na representação junto ao MP chega-se a mais de 27 mil reais.

Jornalistas londrinenses que procuraram mais informações junto ao Instituto Ame Cidade disseram que os números seriam escandalosos mesmo numa cidade de maior porte e orçamento superior, como Londrina ou Maringá.

As pessoas se revoltaram não só com o possível desvio de dinheiro, mas também com a própria existência das diárias, um recurso francamente dispensável para ao pleno exercício da função do vereador procopense, como também abusivo nesta época de crise econômica que atinge todos os municípios. Falta dinheiro em todos os municípios da região até para questões básicas de saúde, educação, segurança e tantas outras necessidades. O próprio prefeito alega falta de verbas até para recapear as ruas de Cornélio Procópio que estão tomadas por buracos.

Nos pedidos de diárias que aparentam irregularidades, a cidade de destino dos vereadores é sempre Curitiba e a maioria das justificativas é tratar de assuntos na Assembleia Legislativa. O deputado estadual procurado pelos suspeitos é sempre Luiz Romanelli, que é do PMDB, mas que em Cornélio Procópio age como se fosse da bancada do prefeito Amin Hannouche, que é do PP.

Ora, como o deputado Romanelli está sempre em Cornélio Procópio, não há justificativa lógica para qualquer vereador gastar dinheiro público para reunir-se com ele em Curitiba.

Outra questão importante relativa às diárias é que elas tiveram um aumento autorizado pelo prefeito Amin Hannouche no dia 11 de fevereiro deste ano. O aumento — que na súmula é tratado como “concessão de diárias” — foi votado em duas sessões, no dia 10 e 11 de fevereiro e sancionado pelo prefeito, com uma rapidez notável, no mesmo dia em que foi aprovada pela Câmara. O único voto contrário foi da vereadora Aurora Fumie Doi, do PMDB.


Reunião demorada

Apenas para exemplificar que mesmo que não esteja ocorrendo nenhuma ilegalidade nos gastos com diárias na Câmara Municipal de Cornélio Procópio, existe um grave descuido com o uso do dinheiro do contribuinte, vamos pegar o exemplo documentado de uma viagem à Curitiba.

O vereador Vanildo Felipe Sotero (PR) assinou uma solicitação de diárias para uma viagem que teria sido feita no período de 25 a 27 de março. As datas estão em contradição com o que atestam as atas da Câmara, que afirmam que no dia 26 de março ele estava em Cornélio Procópio em sessão extraordinária. Já em 27 de março teve outra sessão extraordinária, secretariada por ele.

Mas fiquemos só na suposta viagem para Curitiba. A justificativa da viagem, para a qual o vereador recebeu três diárias, é uma reunião com o deputado Luiz Romanelli (PMDB).


Viagens de vereadores de Cornélio Procópio pagas com o dinheiro do contribuinte são excessivas e fora de propósito

INSTITUTO AME CIDADE, 20 de novembro de 2009


Recordar é viver. E, junto com isso, também é um avivamento da consciência. Nada melhor para ativar a discussão da ética e do bom uso do dinheiro público. Na análise que o Instituto Ame Cidade continua fazendo sobre os gastos na Câmara surgem fatos que atestam um grave desequilíbrio nos gastos públicos municipais.

No dia 6 de julho deste ano uma caravana chefiada pelo prefeito Amin Hannouche e composta de quatro vereadores esteve em Curitiba. Fizeram parte os vereadores Helvécio Alves Badaró (PTB), Sebastião Angelino Ramos (PTB), Sebastião Cristóvão da Silva (PP) e Edimar Gomes Filho (PPS).

A justificativa foi de que viajaram em busca de “recursos para as devidas para melhorias no município”, palavras deles que, por isso, vão devidamente aspadas. Também manteremos na condicional algumas descrições, já que a comparação entre as datas das ações expressas nos documentos mostra que para haver veracidade seria exigido que os vereadores fossem onipresentes. Mas esta qualidade só é concedida à Deus.

Em primeiro lugar, isso de "buscar recursos na capital do Estado" é um claro estratagema para ocultar do eleitor a falta com os deveres básicos do parlamentar: legislar e fiscalizar o executivo, com o acompanhamento de todas as etapas de obras e da manutenção dos serviços no município. É para isso que um vereador é eleito, o resto é balela, tentativa de confundir a opinião pública.

Vereador não traz recurso algum para o município e isso não diminui em nada seu papel público. Simplesmente esta não é sua função. Não existe em nenhuma parte da legislação algo que dê sustentação a essa demagogia. Portanto, para que um vereador transite pela capital do Estado e volte com a mala estufada de verbas para o município ele só pode contar com sua simpatia, uma qualidade até bem-vinda, mas que não serve para convencer de qualquer coisa o governador Requião ou seus secretários.

Mas é evidente que esta viagem teve um custo para o contribuinte procopense. Três dos quatro vereadores que participaram da caravana são citados na representação do Instituto Ame Cidade junto ao Ministério Público pedindo investigação sobre supostas irregularidades em diárias pagas pela Câmara. Um deles, Sebastião Angelino Ramos (PTB), é um grande consumidor de diárias. No período de janeiro a agosto foi o que mais recebeu, totalizando R$ 9.545,00. No mesmo período, Helvécio Badaró recebeu R$ 7.572,94, Edimar Gomes Filho recebeu R$ 6.880,00 e Vanildo Sotero recebeu R$ 3.500,00.

Um fato que chama a atenção é que a viagem para Curitiba com o prefeito foi no dia 6 de julho. Pois no mês seguinte dois vereadores garantem que viajaram novamente para a capital.

O vereador Edimar Gomes Filho (PPS) assinou documento afirmando que esteve lá entre os dias 25 e 27 de agosto. Na mesma data seu nome aparece em ata secretariando a reunião ordinária e também a extraordinária. Ele recebeu 600 reais de diárias de viagem.

Outro participante da caravana que teria viajado para Curitiba no mês seguinte foi Sebastião Angelino Ramos. Ele teria ido no dia 12 de agosto e retornado no dia 14 do mesmo mês. O vereador assinou também assinou documento afirmando que fez outra viagem à Curitiba no mesmo mês, entre os dias 25 e 27. Há uma contradição com sua presença em sessão da Câmara, como mostra a documentação entregue ao MP pelo Instituto Ame Cidade e que o leitor pode ver aqui.

Existem muitas dúvidas sobre a razão dessas supostas viagens. O Ministério Público deve fazer a investigação para apurar se houve realmente alguma irregularidade.

Mas, supondo que não haja desvio de dinheiro público, uma certeza que se impõe é que existe no mínimo um desrespeito com o uso do dinheiro do contribuinte. A agenda dos vereadores citados parece bastante desorganizada. O controle de gastos na Câmara também aparenta ser ineficiente. E a transparência inexiste.

Os vereadores viajaram em julho com o prefeito para Curitiba e depois ainda teriam voltado em agosto, um deles por duas vezes. Uma boa pergunta é por que não aproveitaram a estadia em julho para resolver seus hipotéticos assuntos.

E temos também outra pergunta, que já traz embutida a resposta: se o dinheiro das diárias saísse de seus bolsos, estes vereadores fariam este monte de supostas viagens? É claro que não. Se fosse assim, mesmo que existisse realmente a necessidade de se deslocar para qualquer outra cidade, certamente o vereador procuraria se organizar melhor para equilibrar os custos.

Enfim, agiriam como todos os cidadãos fazem com a administração de seus próprios gastos. A diferença neste caso é que o contribuinte não usa o dinheiro público para viajar.


Sobre democracia e o respeito à participação da sociedade civil

INSTITUTO AME CIDADE, 24 de novembro de 2009


Em vez de responder com seriedade sobre as questões levantadas pelo Instituto Ame Cidade em relação às diárias pagas a vereadores na Câmara Municipal de Cornélio Procópio, seu presidente, Helvécio Alves Badaró (PTB), tem seguido a linha de sempre, numa tentativa inútil de desqualificar o trabalho da organização com uma estranha argumentação, que tem se repetido nas entrevistas em que o assunto é tratado.

Badaró diz que o Instituto Ame Cidade é composto “por pessoas que perderam as eleições”. É evidente que o vereador petebista pretende com isso desviar a atenção das suspeitas de irregularidades que foram encaminhadas para o Ministério Público. Mas este estranho argumento merece umas considerações.

É de se perguntar ao vereador Badaró em que situação ele pretende enquadrar as pessoas que, pertencendo ou não a um partido, não conseguiram se eleger ou não elegeram seus candidatos nas últimas eleições. Em números eleitorais, em Cornélio Procópio foi mais de 60% do eleitorado.

O Brasil é um país democrático, onde são disputadas eleições para cargos públicos de dois em dois anos, sem falar nas disputas em instituições da sociedade civil ou organizações privadas. Como em nosso país existe liberdade de opinião, nada mais lógico que as pessoas que perdem uma eleição mantenham sua visão crítica e se coloquem numa posição de vigilância em relação aos atos públicos dos dirigentes eleitos, exigindo honestidade e transparência na condução dos negócios públicos.

Aliás, é assim que ocorre não só aqui em nosso país, pelo menos depois do final da Ditadura Militar em 1985, mas em qualquer lugar onde haja democracia.

Nossa democracia não só permite a atividade política da sociedade civil, como até busca estimular esta participação como um elemento que traz qualidade a nossa vida política. É assim que se busca a transparência e também a valorização da ética.

Organizações como o Instituto Ame Cidade são parte de uma importante e recente conquista social ocorrida no Brasil, com a crescente participação dos cidadãos em assuntos da esfera pública.

É provável que o vereador Badaró já tenha ouvido falar em “exercício da cidadania”. Pois é isso que fazemos em Cornélio Procópio e no Paraná. Por isso, é bastante estranho que um representante do poder Legislativo venha tentar desclassificar um trabalho tão importante com um argumento tão baixo, como se a participação política fosse privilégio apenas daqueles que conquistam o poder.

Se o Brasil se guiasse do modo pretendido pelo vereador quer, seriam inumeráveis as personalidades públicas que se veriam caladas pelo fato de terem perdido uma ou outra eleição.

Numa democracia não se faz assim. Isso é coisa de regimes totalitários, como o Nazismo de Adolf Hitler ou o Comunismo de Josef Stálin, mas queremos acreditar que o vereador talvez não tivesse a intenção de chegar a um nível tão baixo.

Mas se é para falar em perder eleições e manter-se em atividade sem perder o senso crítico, podemos dar ao presidente da Câmara breves informações históricas, até para que ele perceba que suas argumentações são objeto de riso de quem as ouve.

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso perdeu duas eleições muito importantes. Em 1985 foi derrotado para a prefeitura de São Paulo por Jânio Quadros (1917-1992). Antes, em 1978, havia perdido uma eleição para o Senado. Depois, como todos sabem, foi eleito presidente da República duas vezes, vencendo todos os adversários, inclusive Lula, no primeiro turno.

O próprio Lula, além de perder duas vezes para FHC no primeiro turno, já havia sido derrotado antes por Fernando Collor. Lula, é claro, acabou vencendo depois duas eleições para presidente da República, cargo que ocupa atualmente.

Outro notável perdedor de eleição foi o presidente Abraham Lincoln (1809-1865), um político sem o qual hoje em dia não existiriam os Estados Unidos, país governado por ele na segunda metade do século 19, e a quem devemos também em grande parte, sem dúvida, o atual modelo da democracia ocidental adotado inclusive no Brasil.

Abraham Lincoln foi o criador da expressão “governo do povo, pelo povo e para o povo”, dita por ele um dos discursos mais importantes da história mundial, um tipo de governo pelo qual ele lutou e que na época desejou que “não mais desapareça da face da Terra”.

Lincoln perdeu várias eleições, inclusive uma para o Senado em 1858, dois anos antes de ser eleito presidente dos Estados Unidos.

Exemplos como esses lotam as páginas das histórias, já que na democracia não se lança qualquer descrédito nos que perdem esta ou aquela eleição. Isso é parte do jogo democrático, em conjunto com outras regras, como a ética e a transparência, que deveriam ser respeitadas pelos eleitos.

Aliás, entre os nomes citados acima está o de Jânio Quadros, conhecido por não perder eleições. Ao contrário, teve carreira meteórica, de vereador a presidente da República, vencendo no final da vida a eleição para prefeito de São Paulo em 1985 pelo mesmo PTB do vereador Badaró. E ele sempre foi um desastre. Renunciou à presidência da República e lançou o país em 1961 em uma de suas piores crises e saiu da prefeitura de São Paulo acusado pela própria filha de ter dinheiro roubado na Suiça.

Em política, perder eleição não é defeito algum. O que é lamentável mesmo em política é perder a vergonha.


Sobre enganações que não devem durar

Falemos mais de Abraham Lincoln, o presidente que dirigiu os Estados Unidos no período em que aquele país se definiu como Nação. Lincoln foi um estadista respeitável e deveria ser lembrado mais vezes, especialmente nestes tempos em que qualidades como as dele — inteligência, retidão de caráter, capacidade de trabalho, sobriedade, senso de democracia — andam em falta em nossa política.

Ele simboliza a política feita com objetividade e que traz resultados de qualidade, a política sem a lorota e a enganação que acabam por afastar as pessoas de bem dos assuntos públicos e atrasar a História de qualquer país.

Lincoln foi um grande criador de expressões definidoras de um caminho de qualidade para a política. O já citado "governo do povo, pelo povo e para o povo" vem de um importante discurso seu, proferido na inauguração do Cemitério Nacional de Gettysburg, em novembro de 1863, onde quatro meses antes se deu uma batalha decisiva, no combate com o maior numero de vítimas na Guerra Civil e com resultado favorável à unificação dos Estados Unidos.

É um discurso curto e tornou-se o mais famoso da história daquele país. Em menos de três minutos, Lincoln definiu a igualdade e a importância da unidade para a preservação da democracia e do bem comum.

O que Lincoln fez foi eliminar a pomposidade dos discursos políticos e investir em uma linguagem direta. Ele tem outros escritos políticos, todos de alto valor literário. E com isso transformou não só a política ocidental. Ele ocupa um papel destacado na modernização da língua inglesa, que levou a escritores como Mark Twain e Ernest Hemingway e, por influência dessa literatura no mundo, transformou também outras línguas.

Com já dissemos, Lincoln é um criador de ótimas expressões. E sobre o que vem acontecendo em Cornélio Procópio, tem uma frase dele que explica bem uma situação que com certeza não há de perdurar: "Pode-se enganar todas as pessoas durante algum tempo; pode-se até enganar algumas pessoas durante o tempo todo; mas não é possível enganar todas as pessoas durante o tempo todo".

Nenhum comentário:

Postar um comentário