quinta-feira, 21 de abril de 2011

Índice de homicídios no Paraná é superior ao aceitável pela Organização Mundial da Saúde

GAZETA DO POVO, 21 de abril de 2011

Estado tem média de 30 mortes a cada 100 mil habitantes, o triplo do recomendado pela Organização Mundial da Saúde


O Paraná registrou queda de 21% no número absoluto de homicídios dolosos no estado no primeiro trimestre deste ano, mas segue bem acima dos índices recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A organização considera aceitável dez mortes a cada grupo de 100 mil habitantes. Uma projeção com base nos dados do novo Relatório Estatístico, divulgado ontem pela Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp), mostra que a média estadual é de 30 assassinatos por 100 mil. Na capital e na região metropolitana, os índices sobem para 40 e 60 mortes a cada 100 mil, respectivamente. Números que contrastam com o vizinho estado de São Paulo, que baixou suas estatísticas para dentro dos limites da OMS. “Um estado como o Paraná não deve tolerar índice superior a 15 mortes por 100 mil”, afirma o ex-secretário nacional de Segurança Pública e coronel da reserva da Polícia Militar José Vicente da Silva Filho.

Após seis meses sem divulgação de dados sobre criminalidade, a Sesp festejou a queda no número de homicídios, de 1.001 casos entre janeiro e março de 2010 para 790 no mesmo período deste ano. Porém, uma análise mais apurada dos números revela que a redução se deu sobre uma base muita alta, totalmente atípica em relação ao primeiro trimestre de anos anteriores.

Embora aponte a diminuição de mortes em 2011, ainda não é possível constatar tendência contínua de queda nos homicídios. “Para confirmar isso são necessários três trimestres seguidos em baixa. É muito cedo para comemorar. A Unesco esperou três anos para avaliar São Paulo e constatar que o crime estava caindo”, explica Silva Filho.

Contudo, o secretário de Segurança do Paraná, Reinaldo de Almeida César, diz que a baixa se deve às atitudes do novo governo, como operações da PM, blitzes de inspeção e apreensão. “A meta deste governo é investir para que esses números continuem em queda”, afirma.

O governo aproveitou a formatura de nova turma de policiais militares para divulgar o balanço. Por falta de reposição, o déficit da Polícia Militar é de 20% e o da Polícia Civil, de 50%. “Hoje, temos menos policiais do que há dez anos”, criticou o secretário. A meta do governo estadual é contratar mais 5 mil policiais nos quatro anos de gestão. Para o coronel Marcos Teodoro Scheremeta, comandante-geral da PM do Paraná, o policiamento ostensivo é o principal recurso para diminuir a criminalidade. “O que mais causa impacto é a polícia na rua”, avalia. “Podemos atacar focos de alta densidade populacional, em zonas de risco ou concentrações de comércio”, justifica.

Mas, para especialistas, o aumento do efetivo e de operações da polícia precisa estar atrelado a outras ações. De acordo com o sociólogo Luís Flávio Sapori, professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG) e secretário executivo do Instituto Minas pela Paz, as ações policiais não são eficientes para prevenir casos de homicídio, por exemplo. “Esse tipo de ação consegue causar impacto, principalmente, em crime contra o patrimônio. O que previne homicídios é o policiamento em locais onde o tráfico de drogas é forte, com busca e apreensão de drogas e armas, e prisão de homicidas condenados e foragidos”, diferencia.

Inteligência - Sapori salienta que o patrulhamento ostensivo deve ser complementado com inteligência. “Aumentar o número de policiais e equipamentos é importante. Mas deve ser feito paralelamente a investimentos em investigação. Além disso, o patrulhamento não pode ser aleatório, e sim focado nas áreas e horários em que os crimes costumam ocorrer”, diz. O estado, porém, precisa aumentar o investimento em inteligência, sobretudo no geoprocessamento, rastreamento de dados e perícia, melhorando a distribuição do aparato policial. Em 2009, de um orçamento de R$ 1,2 bilhão para a segurança, o Paraná destinou 1,64% (R$ 20 milhões) para o setor.

Silva filho tem opinião semelhante, alegando que o problema do Paraná se deve à falta de estrutura para monitorar o crime e de uma gestão moderna para detectar os problemas e agir com correção semanal. “Esse foi fator decisivo para a queda da violência em São Paulo. Semanalmente, todo policiamento é reestruturado em função do mapa de crimes”, afirma.

Furtos e roubos - Além dos homicídios dolosos, os roubos e furtos também registraram queda no Paraná, segundo a Sesp. As reduções foram de 10,42% e 5,50%, respectivamente, no primeiro trimestre de 2011.

52% das mortes foram em Curitiba e região - Metade dos assassinatos no Paraná no primeiro trimestre de 2011 ocorreu em Curitiba e região metropolitana. Com respectivos 189 e 220 homicídios, as duas regiões concentraram 52% do número de mortes. Para o coronel Marcos Teodoro Scheremeta, comandante-geral da Polícia Militar no estado, a densidade populacional influencia diretamente nessas estatísticas – 31% da população mora na capital e no entorno.

“É uma região que tende a acumular mazelas sociais, tráfico de drogas – que está em todas as classes sociais –e a formação de uma sociedade consumista”, afirma. “Em uma grande concentração de pessoas, os bandidos têm a sensação de que podem se esconder e fugir com mais facilidade”, diz.

Com índices de 40 e 60 assassinatos a cada grupo de 100 mil habitantes, Curitiba e região metropolitana vive uma realidade distante de São Paulo, por exemplo. A capital paulista apresenta índice inferior a 10 homicídios a cada 100 mil, conforme recomenda a Organi­za­ção Mundial de Saúde. “O Paraná deveria ter dado salto no combate à violência assim como São Paulo, pois apresentava melhores condições para isso”, critica o ex-secretário nacional de Segurança Pública José Vicente da Silva Filho.

Coordenador-executivo do Observatório de Segurança Pública da Universidade Estadual Paulista (Unesp/Marília), o doutorando em Políticas Públicas Bóris Ribeiro de Magalhães argumenta que a ocorrência de delitos menores tende a continuar ocorrendo nas grandes cidades, mas há risco de os homicídios migrarem para cidades de menor porte. “O crime, especialmente os homicídios, migram para o interior em razão da vigilância menor”, afirma. “As metrópoles estão mais vigiadas e, em geral, dispõem de mais aparatos para segurança. É mais fácil assaltar uma agência bancária de uma cidade com 3 mil habitantes do que em uma capital”, diz.

Diferença - Os números divulgados não batem com os relatórios de mortes do Instituto Médico-Legal. Os boletins apontam a entrada de corpos no IML vítimas de ferimentos de arma de fogo ou branca, ou de agressão física. A delegada-chefe da Delega­cia de Homicídios, Maritza Haisi, no entanto, explica que nem todas as mortes informadas pelo IML dizem respeito a homicídios: podem se tratar de latrocínios e de lesão corporal seguida de morte.

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